CRESS em Movimento: Ética, Trabalho e Organização

O Conselho Regional de Serviço Social 19ª Região-Goiás, gestão CRESS em Movimento: Ética, Trabalho e Organização, devido a solicitação das colegas e boa avaliação do Seminário de Formação Continuada ocorrido em 2009, promove em parceria com a PUC, UCG e IFG o Seminário de Formação Continuada para as colegas.

O evento gratuíto às colegas inscritas no CRESS 19Reg. é mais um dos compromissos do CRESS assumidos e cumpridos.

Com o tema O processo de Trabalho do Assistente Social, o curso tem início no próximo dia 22 (segunda-feira) e termina em dezembro. Todas(os) Assistentes Sociais inscritas(os) e em dia com o CRESS tem direito à inscrição gratuita. http://www.cressgo.org.br


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CAPITAL E TRABALHO NO PROCESSO DE URBANIZAÇÃO

"O estudo da exploração do trabalho e da emergência das “mediações de segunda ordem no sistema de metabolismo social do capital” no processo de ocupação e urbanização do município de Caldas Novas, Goiás1, perpassa pela concepção de que o trabalho, inerente ao ser social, historicamente redimensiona as relações sociais, subordinando-se ao capital (e ao mercado). Nas “sociedades nacionais dependentes, de origem colonial, o capitalismo é introduzido antes da constituição da ordem competitiva” (FERNANDES, 1974, p. 149). As estruturas econômicas e sociais no período colonial são apenas superficialmente adaptadas ao capitalismo. Findo o regime colonial, há uma adequação das estruturas econômicas nacionais ao mercado mundial, fortalecendo a construção de uma economia nacional independente".

(MACHADO, M. C. S. FRAGMENTOS DE CULTURA, Goiânia, v. 16, n. 11/12, p. 919-939, nov./dez. 2006).

http://seer.ucg.br/index.php/fragmentos/article/view/187/150


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PRINCIPIOS FUNDAMENTAIS DO ASSISTENTE SOCIAL

(Código de Ética de 1993)
- Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a ela inerentes - autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais;
- Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo;
- Ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de toda sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis sociais e políticos das classes trabalhadoras;
- Defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização da participação política e da riqueza socialmente produzida;
- Posicionamento em favor da eqüidade e justiça social, que assegure universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática;
- Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e à discussão das diferenças;
- Garantia do pluralismo, através do respeito às correntes profissionais democráticas existentes e suas expressões teóricas, e compromisso com o constante aprimoramento intelectual;
- Opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem dominação-exploração de classe, etnia e gênero;
- Articulação com os movimentos de outras categorias profissionais que partilhem dos princípios deste Código e com a luta geral dos trabalhadores;
- Compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional;
- Exercício do Serviço Social sem ser discriminado, nem discriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, opção sexual, idade e condição física(Resolução CFESS CFESS Nº 290/94 E 293/94).

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POESIAS

TOTALIDADE - Karl Marx

Já não posso ocupar-me tranqüilamente
Do que se apodera fortemente da minha alma
Já não posso permanecer em paz
E lanço-me ao trabalho.
Tudo quisera conquistar,
Todos os favores dos deuses
E possuir o saber
Abraçar toda a arte



OUSADIA - Karl Marx

É por isso que preciso de tudo ousar
Sem nunca ter descanso
Não fiquemos calados
Sem nos querermos realizar
Não nos submetamos
Silenciosos e crédulos
Ao jugo humilhante
Pois que nos restam o desejo e a paixão
Pois que nos resta a ação.


ACREDITE APENAS - Bertold Brecht
Acredite apenas no que seus olhos vêem e seus ouvidos
Ouvem!
Também não acredite no que seus olhos vêem e seus
Ouvidos ouvem!
Saiba também que não crer algo significa algo crer!

http://nupac.sementeira.net/index.html

9/23/2025

Tema: MÉTODO DE PESQUISA EM CIÊNCIAS SOCIAIS EM DURKHEIM

Tema: MÉTODO DE PESQUISA EM CIÊNCIAS SOCIAIS EM DURKHEIM

Objetivo: Introduzir as bases do conhecimento científico para prosseguir com os fundamentos em Durkheim.

Metodologia: Seminário seguido de debate mediado pela docente e por uma mestranda

Recurso: Datashow

Avaliação: Posicionamento das estudantes em relação ao conteúdo, metodologia e referências.

Karl Marx (Alemanha, 1818  – Inglaterra, 1883). Meados do século XIX, influência forte em política e economia.

Friedrich Engels (Alemanha, 1820- Inglaterra, 1895)

Émile Durkheim (França, 1858 – França, 1917) Fim do século XIX, influência na fundação científica da sociologia.

Max Weber (Alemanha, 1864 – Alemanha, 1920).  Início do século XX, influência na sociologia compreensiva e análise da modernidade

Antonio Gramsci (Itália, 1891 – Itália, 1937)

 

Émile Durkheim viveu de 1858 a 1917. Nasceu em Épinal, região de Lorena, na França, 15 de abril de 1858. Não seguiu o caminho traçado pela família judia com pai e avô rabinos. Implementou a sociologia na academia, criou a teoria da coesão social, as regras do método sociológico (positivista).

Durkheim estudou no Colégio d’Epinal e no Liceu de Paris e na Escola Normal Superior de Paris. Lecionou em diversos liceus provinciais franceses.

Entre 1885 e 1886, Durkheim realizou uma viagem de estudo na Alemanha, especializando-se em Sociologia. Dentro da Sociologia educacional filiou-se à corrente denominada Pedagogia Social. Foi fortemente influenciado pelos métodos de psicologia experimental de Wilhelm Wundt.

Em 1887, Durkheim foi nomeado professor da primeira cadeira de Ciências Sociais, associada à educação, na Universidade de Bordeaux. Em 1896 fundou a revista “L’Année Sociologique”, quando reuniu um eminente grupo de estudiosos. Em 1902, foi convidado para lecionar Sociologia e Pedagogia na Sorbonne, onde permaneceu até sua morte.”

Foi seguidor de Comte e o superou, pois tinha uma visão ampliada de sociedade: sociedades tradicionais mecânicas (primitivas) e sociedade orgânica ou industrial (capitalismo).

Enquanto Comte defendia o eurocentrismo, Durkheim dialoga com a antropologia e a história Escola dos Annales que foi um movimento historiográfico francês iniciado em 1929 pelos historiadores Marc Bloch e Lucien Febvre, que propôs uma renovação radical da escrita da história, abandonando o foco em acontecimentos e eventos para priorizar a análise dos processos de longa duração, as mentalidades, e o diálogo com as ciências sociais.

Para Durkheim, fato social é a matéria prima da sociologia.

O fato social requer rigorosa metodologia para estuda-lo, deve ser estudado como coisa, externo aos indivíduos, não é estudado numa perspectiva subjetiva, é objetivo, análise desprovida de valores subjetivos, não ocorre por iniciativa individual, suas causas são sociais externas às vontades individuais, não tem explicação psicológica, explicações sociológicas é externa ao observador, o sociólogo deve fazer uma observação externa à sociedade, isenta de opiniões.

Comte parte do pressuposto de que a sociedade europeia é um modelo a ser atingido.

Durkheim propõem: separar, analisar, explicar, comparar. Para  ele, a sociedade não é apenas a soma de indivíduos. O principal fato social são as instituições sociais. Todas as instituições são coletivas e coercitiva, tem regras que não pode ser violada, são conservadoras, quem rompe as ordens podem ser punidos. A formação da sociedade

 

As principais obras de Émile Durkheim são:

1)  Da Divisão do Trabalho Social. Conclusão: 1893. Publicação: 1893

2)  As Regras do Método Sociológico. Conclusão: 1894. Publicação: 1895

3)  O Suicídio: Um Estudo de Sociologia. Conclusão: 1896. Publicação: 1897

4)  As Formas Elementares da Vida Religiosa. Conclusão: 1911. Publicação: 1912

5)  A Educação e a Sociologia (póstuma). Conclusão: 1902-1911 (conferências na Sorbonne). Publicação: 1922

6)  A Educação Moral (póstuma). Conclusão: 1902-1903 (curso na Sorbonne). Publicação: 1925

7)  Sociologia e Filosofia (póstuma). Conclusão: 1890-1915 (ensaios e conferências em diferentes períodos). Publicação: 1924 (em francês) / 1929 (traduções e edições posteriores)

Algumas obras póstumas, como A Educação e a Sociologia, A Educação Moral e Sociologia e Filosofia, não tiveram uma “conclusão” em um único ano, porque foram compilações de cursos e ensaios publicados após a morte de Durkheim (1917). Por isso, marquei o período em que foram efetivamente elaborados.

 

Obra DA DIVISÃO DO TRABALHO SOCIAL de 1893

 

Nesta obra, Durkheim analisa as funções sociais do trabalho e a especialização do trabalho. A obra consta de 3 livros e diversos capítulos.

A divisão do trabalho propicia a solidariedade: mecânica ou orgânica. 

Na solidariedade mecânica, os indivíduos se organizam no exercício de tarefas semelhantes, compartilhando preferências e até mesmo uma consciência coletiva relativamente homogênea. Nesta sociedade em específico, predomina o grupo sobre o indivíduo (o todo é mais importante que a parte), manifestando-se na forma da família, da Igreja e do Estado. O Direito, por sua vez, acaba por se caracterizar como repressivo, baseado na tradição e nos bons costumes, à medida que os crimes reconhecidos pelo ordenamento são entendidos numa relação vertical, do indivíduo contra a sociedade (da parte contra o todo). A solidariedade mecânica se vê predominantemente em sociedades pré-capitalistas (tidas como primitivas), e os indivíduos, em cujo trabalho possuem uma maior atuação nos diferentes ciclos de produção de um bem, mostram-se mais autônomos em relação aos outros, se comparados aos indivíduos da sociedade de solidariedade orgânica. 

Solidariedade orgânica ocorre em sociedades complexas com a socialização que não ocorre por semelhança entre indivíduos, mas pela interdependência, já que agora suas atividades são separadas em partes de um processo produtivo – um precisa do outro para obter todos os bens finais necessários para sua vida.

Em relação à criminalidade, os crimes são agora vistos não mais como uma agressão à sociedade, mas numa relação horizontal: o crime é cometido entre os indivíduos (a parte contra a parte); não é mais contra o Estado ou a sociedade, de forma objetiva, mas contra o indivíduo, a partir de uma noção progressiva de direitos individuais e subjetivos. Não é mais suficiente o simples caráter punitivo do direito penal: é necessária uma restituição, uma reparação de danos – a justiça não é mais simplesmente a retribuição da pena, mas a obrigação de restabelecer o prejuízo causado, na medida do possível.

 

Obra AS REGRAS DO MÉTODO SOCIOLÓGICO, publicação 1895

 

Em 1895, Émile Durkheim publicou sua obra fundamental, “As Regras do Método Sociológico”, que constitui uma síntese da Sociologia como uma nova ciência social. Nele, Durkheim delimita o campo da nova ciência e propõe uma metodologia de estudo, condição indispensável ao estabelecimento da legitimidade de qualquer ciência.

Para ele, o objetivo do estudo da Sociologia não pode ser baseado em uma soma de indivíduos e sim em um fato social. Dentro de sua perspectiva, os fatos sociais devem ser considerados como “coisas”, com existência própria, exteriores às consciências individuais.

É necessário respeitar e aplicar um método científico, aproximado, dentro do possível, das outras ciências exatas. Devendo-se evitar preconceitos e julgamentos subjetivos.

Para Durkheim a questão da ordem social foi uma preocupação constante. De forma sistemática ocupou-se de como estabelecer  o objeto de estudo da Sociologia assim como seu método de investigação. Também foi através de Durkheim que a Sociologia penetrou a Universidade, conferindo a esta disciplina seu caráter acadêmico.

Sua obra foi elaborada num período de constantes transformações socioeconômicas, que causavam desemprego e miséria à população de trabalhadores, provocando lutas entre as classes, com o proletariado passando a utilizar a greve como meio de enfrentamento à burguesia, fundando sindicatos. Ao mesmo tempo, o período de transição do século XIX para o atual, é marcado pelo aparecimento da eletricidade e do petróleo, isso de certo modo, criou um clima de otimismo e esperança em torno do progresso econômico.

Nesse sentido, Durkheim tinha uma visão positiva da nascente

sociedade industrial. Considerava que o crescimento da divisão social do trabalho poderia possibilitar, ao invés de conflitos sociais, um sensível aumento da solidariedade entre os homens: “

Tendo em vista que ela aumenta simultaneamente a força produtiva e a habilidade do trabalhador, ela é a condição necessária de desenvolvimento intelectual e material das sociedades; ela é a fonte da civilização” (Durkheim, 1978, p. 23).

De acordo com Durkheim se cada membro da sociedade tem uma atividade profissional mais especializada, passa a depender cada vez mais do outro. Isso cria a solidariedade.

Para Durkheim, a crise que estava ocorrendo com as transformações socioeconômicas era devido à ausência de regras morais que pudessem guiar o comportamento dos indivíduos. Isso dificultava o bom funcionamento da sociedade, fazendo com que está mergulhada em um estado de anomia, isto é, uma demonstração contundente que a sociedade se encontrava doente. Ele exemplifica isso com o frequente aumento de suicídios que ocorriam nas grandes metrópoles europeias como Paris. Para ele, o suicídio era um bom indício de que a sociedade se encontrava incapaz de exercer controle sobre o comportamento dos indivíduos.

Segundo Stephen Warner, na sociedade moderna, industrial e  urbana analisada por Durkheim havia dois tipos de suicídios crescentes: o egoísta e o anômico. O egoísmo é um estado de solidariedade insuficiente no qual o indivíduo se vê demasiadamente abandonado  às suas próprias forças, tendo poucas fontes socialmente estruturadas de apoio e não tem mais sentido de responsabilidade consigo mesmo.

É nas famílias pequenas que está o maior índice de suicídios egoístas porque esta encontra-se pouco relacionada com a sociedade. Pois a vida social quando está centra da em torno de uma grande família ou a uma comunidade religiosa possui fortes impedimentos para os exageros individuais. Estes sentem-se mais recompensados com os benefícios que destas instituições podem tirar.

Disposto então a restabelecer a “saúde” da vida social, Durkheim insistia que era necessário criar hábitos e comportamentos no homem moderno, visando o bom funcionamento da mesma. Assim, tinha fundamental importância incentivar a moderação dos interesses econômicos, enfatizar a noção de disciplina e dever, assim como difundir ao culto à sociedade, às suas leis e à hierarquia existentes (MARTINS, 1986: 48).

Nessa perspectiva, a Sociologia tem por função detectar e buscar soluções para os problemas sociais, restaurando a normalidade como uma técnica de controle social. Entretanto, à Sociologia era ainda necessário um método e objeto específicos de estudo, pois nenhuma ciência se constitui sem esses dois elementos básicos de atuação.

Assim, no livro “As regras do método sociológico”, que é objeto desta resenha, Durkheim concentra seus esforços no estabelecimento do objeto sociológico e no modo de agir do investigador ao fazer a pesquisa.

Preocupado em estabelecer um objeto de estudo e um método, Durkheim dedicou-se a esta questão salientando que  nenhuma ciência poderia ser considerada como tal, se não tivesse uma área própria de investigação. A Sociologia deveria se ocupar de um conjunto de fenômenos que difeririam das áreas de estudo de outras disciplinas como a Psicologia e a Biologia. Nesse sentido, Durkheim vai estabelecer precisamente o objeto de investigação da Sociologia.

Ele inicia pois pela fixação do objeto de observação da Sociologia, definindo e caracterizando o que chama de fatos sociais.

 

Obra O SUICÍDIO: UM ESTUDO DE SOCIOLOGIA, publicação 1897

 

O suicídio é, segundo Durkheim, “todo o caso de morte que resulta, direta ou indiretamente, de um ato, positivo ou negativo, executado pela própria vítima, e que ela sabia que deveria produzir esse resultado”. Conforme o sociólogo, cada sociedade está predisposta a fornecer um contingente determinado de mortes voluntárias, e o que interessa à sociologia sobre o suicídio é a análise de todo o processo social, dos fatores sociais que agem não sobre os indivíduos isolados, mas sobre o grupo, sobre o conjunto da sociedade. Cada sociedade possui, a cada momento da sua história, uma atitude definida em relação ao suicídio.

Há três tipos de suicídio, segundo a etimologia de Durkheim, a saber:

1.           Suicídio Egoísta: é aquele em que o ego individual se afirma demasiadamente face ao ego social, ou seja, há uma individualização desmesurada. As relações entre os indivíduos e a sociedade se afrouxam fazendo com que o indivíduo não veja mais sentido na vida, não tenha mais razão para viver;

2.           Suicídio Altruísta: é aquele no qual o indivíduo sente-se no dever de fazê-lo para se desembaraçar de uma vida insuportável. É aquele em que o ego não o pertence, confunde-se com outra coisa que se situa fora de si mesmo, isto é, em um dos grupos a que o indivíduo pertence. Temos como exemplo os kamikazes japoneses, os muçulmanos que colidiram com o World Trade Center em Nova Iorque, em 2001, etc.;

3.           Suicídio Anômico: é aquele que ocorre em uma situação de anomia social, ou seja, quando há ausência de regras na sociedade, gerando o caos, fazendo com que a normalidade social não seja mantida. Em uma situação de crise econômica, por exemplo, na qual há uma completa desregulação das regras normais da sociedade, certos indivíduos ficam em uma situação inferior à que ocupavam anteriormente. Assim, há uma perda brusca de riquezas e poder, fazendo com que, por isso mesmo, os índices desse tipo de suicídio aumentem. É importante ressaltar que as taxas de suicídio anômico são maiores em países ricos, pois os pobres conseguem lidar melhor com as situações de anomia social.

 

Obra AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA, publicação 1912

 

Sobre os fenômenos religiosos, Durkheim escreveu uma de suas obras mais significativas, “As Formas Elementares da Vida Religiosa” (1912), baseada em diversas observações antropológicas, buscando mostrar as origens sociais e cerimoniais, como também as bases da religião, especialmente do totemismo.

Afirmou que não existem religiões falsas, que todas são essencialmente sociais. Definiu religião como “Um sistema universal de crenças e práticas relativas às coisas sagradas”, que unem os indivíduos que dela compartilham em uma única comunidade moral, denominada igreja.

Durkheim tem um interesse pela religião porque ela articula rituais e símbolos que têm o efeito de criar entre indivíduos afinidades sentimentais que constituem a base de classificações e representações coletivas. As cerimônias religiosas cumprem um papel importante ao colocarem a coletividade em movimento para sua celebração: elas aproximam os indivíduos, multiplicam os contatos entre eles, torna-os mais íntimos e por isso mesmo, o conteúdo das consciências muda.

Ao tomar como objeto a religião, Durkheim tenta estabelecer que ela não suponha necessariamente a crença num Deus transcendente. Ela é antes de tudo um “sistema de crenças e de práticas”. A religião é vista como um fenômeno coletivo, onde ele procura mostrar de forma concludente que não pode haver crenças morais coletivas que não sejam dotadas de um caráter sagrado. Sua existência baseia-se numa distinção essencial entre fenômenos sagrados e profanos. É um conjunto de práticas e representações que vemos em ação tanto nas sociedades modernas quanto nas sociedades primitivas. Portanto, sua sociologia da religião está referida a uma teoria do conhecimento e à questão da coesão social.

Para Durkheim, a racionalidade prática jamais pode ser o fundamento da orientação da ação social e muito menos de qualquer forma de sociabilidade. Para ele, a racionalidade humana está assentada sobre bases emocionais, e, portanto, não racionais, as quais fornecem os elementos que lhe precedem logicamente operar, quais sejam: uma cosmologia e uma solidariedade pré-contratual.

Na visão cosmológica de Durkheim, a religião implica a ideia de que a sociedade é um todo organicamente integrado no qual se encontram distribuídas, classificadas e hierarquizadas as pessoas e os objetos o que lhes permite prover as experiências individuais de categorias e conceitos, permitindo-lhes transcender as sensações imediatas e amorfas que lhes são próprias. O elemento da solidariedade pré-contratual, segundo Durkheim é a confiança que as pessoas precisam ter umas nas outras para poderem estabelecer relações contratuais; é o aval que as encoraja a buscar o ajuste de seus interesses. Assim, para Durkheim, estes resultam de sentimentos compartilhados e não de bases cognitivas.

Durkheim, ao se opor a racionalidade prática de Marx e acentuar os aspectos emocionais, reporta-se às representações coletivas, essências de energias de origem sagradas. Chama estes de “totens”, cuja representação é geralmente considerada mais sagrada que o próprio totem em si. O totem simboliza simultaneamente a energia sagrada e a identidade do grupo clânico.

Grupo Clânico é um grupo social, cultural e político pertencente a um clã, famílias interligadas por laços de parentesco com descendência de um antepassado comum.

Neste contexto, Durkheim se pergunta: “Se o totem simboliza simultaneamente o deus e a sociedade, não será porque o deus e a sociedade são uma e a mesma coisa?”

Segundo Giddens (1990), essa relação que Durkheim estabelece aqui entre a sociedade e o sagrado não pode ser mal interpretada. Ele não afirma que “a religião cria a sociedade”, porém ele defende que a religião é a expressão da autocriação, da evolução autônoma, da sociedade humana. Neste sentido, não seria uma teoria idealista, mas antes da obediência ao princípio metodológico que diz que os fatos sociais têm de ser explicados em termos de outros fatos sociais.

Na compreensão de Durkheim os seres animados ou inanimados são antes de qualquer coisa sagrados ou profanos. O sagrado é todo o ser cuja aproximação requer preparação e cuidados especiais, o profano, constitui o “resto”: os seres com os quais se podem relacionar sem qualquer precaução. A esta crença básica da religião, Durkheim introduz a concepção do ritual (procedimento pelo qual a pessoa deve se conduzir na presença de objetos sagrados).

Para Durkheim, a dualidade sagrado-profana faz da religião uma realidade intelectual e os rituais fazem dela uma força moral: uma entidade que define limites entre o certo e o errado e os faz operar na medida em que recompensa quem está certo e pune quem está errado. Trata-se de promover sentimentos de fazer parte e de exclusão. Nesta perspectiva, indivíduos aderem a preceitos de moralidade. Buscam a coletividade do grupo e a coesão deste deriva de sua força moral – de sua capacidade de definir e implementar limites entre o certo e o errado – mas, para as pessoas é difícil de entender diretamente, então elas projetam em formas concretas, por exemplo, os totens. Portanto, a unidade das pequenas sociedades tradicionais é assegurada pela existência de uma forte consciência coletiva. A unidade dessas sociedades é devida ao fato de os seus membros aderirem a crenças e a sentimentos comuns. Os ideais expressos nas crenças religiosas são, pois, os ideais morais em que se baseia a unidade da sociedade. Sempre que os indivíduos se juntam num ritual religioso, estão a afirmar a sua fé na ordem moral de que depende a solidariedade mecânica dessa sociedade. Os ritos positivos do ritual religioso contribuem, assim, para a consolidação moral do grupo, contrabalançando o fato de os indivíduos procurarem satisfazer nas atividades quotidianas da vida, no mundo profano, os seus próprios interesses egoístas, o que os leva a alhear-se dos valores morais em que assenta a solidariedade social.

Durkheim definiu a religião como um sistema solidário de crenças e de práticas relativas a coisas sagradas, isto é, separadas, interditadas, crenças e práticas que unem numa mesma comunidade moral, chamada igreja, todos os que aderem a ela.

Durkheim em sua sociologia da religião teve certa ingenuidade de admitir que o mesmo totem servisse para explicar todas as realidades, isto é, se as ideias de sagrado, da alma e de deus (sinônimo de sociedade) explicassem sociologicamente o caso dos australianos, poderiam estes extrapolarem todos aqueles povos que manifestarem as mesmas ideias com as mesmas características essenciais. Investigações etnográficas já têm revelado que há povos com clãs e sem totens e povos com totens sem clãs. Ainda que o totemismo pudesse surgir do instinto gregário, ele não pode ser provado nem tampouco pode demonstrar-se que outras formas religiosas provêm do totemismo. E por último, a dicotomia entre sagrado e profano não pode manter-se já que se dão no mesmo nível de experiência e, em vez de estarem claramente diferenciados, estão tão entrelaçados que resultam inseparáveis.

 

 

Obra EDUCAÇÃO E SOCIOLOGIA, publicação 1922

 

Cada sociedade alimenta certo ideal humano. A educação aparece como um amplo processo socializador onde pais e educadores ensinam as crianças e adolescentes com base num ideal compartilhado pela sociedade. 

A educação é uma ação exercida com a justificativa da manutenção da coesão social diante da imaturidade que crianças e jovens carregam.

“A sociedade não somente eleva o tipo humano à dignidade de modelo para o educador reproduzir, como também o constrói, e o constrói de acordo com suas necessidades. […] O homem que a educação deve realizar em nós não é o homem tal como a natureza o criou, mas sim tal como a sociedade quer que ele seja.” (p. 107)

Duas dimensões da consciência do indivíduo: os pensamentos individuais e o pensamento coletivo, este último obviamente está ligado a um sistema de ideias, sentimentos e hábitos que exprimem os grupos dos quais pertencemos; ambos formam o que Durkheim chama de ser social, que é o objetivo da educação.

“Ela tem como objetivo suscitar e desenvolver na criança um certo número de estados físicos, intelectuais e morais exigidas tanto pelo conjunto da sociedade política quanto pelo meio específico ao qual ela está destinada em particular. (p. 13)”

Com base nessa análise, Durkheim estabelece uma diferenciação entre educação e pedagogia e depois reivindica um lugar para a sociologia nos estudos sobre os fenômenos educacionais. Na primeira critica estabelece a educação como ação exercidas pelos pais e professores — portanto, algo geral e constante — e a pedagogia se ocupa nas formulações teóricas que explicitam as maneiras de conceber a educação, ou seja, se ocupa com os processos reflexivos que envolvem a educação.

Para Durkheim a pedagogia é rebelde, pois está sempre repensando suas ações.

Seguindo este caminho Durkheim reforça o papel da Sociologia, pois se trata de um papel “preponderante para a determinação dos fins que a educação deve buscar” (p. 114). Apenas a sociologia pode ajudar a compreender o fenômeno da educação, pois os fenômenos educacionais estão relacionados com o sistema social e a dimensão individual que a psicologia estuda indicam os mecanismos para readequar os indivíduos aos processos mais amplos da vida social. Essa crítica direcionada a psicologia aparece porque os estudos da época a relacionava com a pedagogia.

É perceptível na argumentação de Émile Durkheim a sua perspectiva sociológica sobre a sociedade. Pesa aqui uma estrutura que é anterior aos indivíduos e que determina as formas de pensar, sentir e agir no convívio com a coletividade. O Durkheim apresenta a educação como uma dimensão socializadora que coloca crianças e jovens numa posição de passividade, como se esses não fossem sujeitos que também influenciam o coletivo. A influência positivista, neste sentido, retira a historicidade das coisas e as apresenta de maneira descritiva, cristalizando assim uma essencialidade que não evidencia seu processo construtivo.

 

Obra A EDUCAÇÃO MORAL, publicação 1922

O livro reúne lições ministradas por Durkheim na Sorbonne, voltadas para a formação de professores. Seu objetivo era pensar a educação como fenômeno social, ressaltando seu papel na integração dos indivíduos na sociedade moderna.

Durkheim entende a educação moral como missão fundamental da escola moderna: transmitir disciplina, criar sentimento de pertencimento coletivo e desenvolver autonomia. Assim, a educação garante coesão social e cidadãos conscientes.

1.           A educação como fato social

Para Durkheim, a educação não é apenas transmissão de conhecimentos individuais, mas um processo de socialização sistemática.

Ela molda condutas, valores e hábitos de acordo com as necessidades da coletividade.

2.           Educação moral

A moral não se reduz a regras abstratas ou religiosas: é uma forma de regular a vida em sociedade.

A escola deve transmitir os princípios morais fundamentais, garantindo a coesão social.

3.           Três elementos da educação moral

Disciplina: interiorização de regras, limites e respeito à autoridade; cria a consciência da obrigação.

Adesão ao grupo social: desenvolvimento do sentimento de pertencimento, solidariedade e responsabilidade.

Autonomia da vontade: o indivíduo deve compreender as regras e aceitá-las de forma consciente, não apenas por imposição externa.

4.           Função da escola

A escola ocupa lugar central, pois prepara os cidadãos para a vida social.

O professor é visto como “representante moral da sociedade” diante dos alunos.

Durkheim inaugura uma reflexão sociológica sobre a educação, mostrando que formar moralmente o indivíduo é condição para a manutenção da ordem social.

Sua visão reflete o contexto da Terceira República Francesa, marcada pelo esforço de consolidar valores republicanos (laicidade, civismo, solidariedade).

A obra mostra a tensão entre disciplina e liberdade, autoridade e autonomia, propondo equilíbrio entre esses polos na formação moral.

 

Obra Sociologia e Filosofia, publicação 1929

 

Publicado em 1924, após a morte de Durkheim, o livro reúne ensaios e conferências em que o autor discute as relações entre a sociologia e a filosofia. Ele defende a sociologia como ciência autônoma, mas que dialoga com a tradição filosófica.

Essa obra Marca o esforço de Durkheim em consolidar a sociologia como disciplina científica, distinta da filosofia, mas ainda em diálogo com ela. Reforça a visão de que os fatos sociais são realidades objetivas que condicionam o indivíduo. Mostra a preocupação de Durkheim em fundamentar uma moral laica e racional, adequada à sociedade moderna.

Em Sociologia e Filosofia, Durkheim afirma a autonomia da sociologia frente à filosofia, mas destaca o diálogo entre ambas. A obra defende que moral, religião e consciência têm origem social, não individual, e que a sociologia, ao estudá-los cientificamente, contribui para repensar os fundamentos da vida coletiva.

1.           Autonomia da Sociologia

A sociologia não é mera aplicação da filosofia; é uma ciência positiva, com métodos próprios, dedicada ao estudo dos fatos sociais.

Sua função é explicar a vida social a partir de causas sociais, não por especulações metafísicas.

2.           Crítica ao psicologismo e ao individualismo

Durkheim combate a ideia de que a moral, a religião e a consciência se explicam apenas pela psicologia individual.

Para ele, esses fenômenos têm origem social e só podem ser entendidos em seu contexto coletivo.

3.           Moral e religião como fenômenos sociais

A moral e a religião não são ilusões ou construções subjetivas, mas realidades objetivas, sustentadas pela vida coletiva.

A moral fornece regras de conduta e a religião cria coesão social.

4.           Sociologia e Filosofia prática

A sociologia contribui para a filosofia ao fornecer bases empíricas para a reflexão ética e política.

A filosofia, por sua vez, ajuda a sociologia a pensar os princípios e valores universais que estruturam a vida social.

5.           Ciência e normatividade

Embora a sociologia busque explicar objetivamente os fatos, ela também tem implicações normativas: ao compreender a moral e a coesão, indica caminhos para a organização social.

 

DEFINIÇÃO DE FATO SOCIAL

 

Durkheim define fato social como entidades reais, autônomas, passíveis de constatação empírica e não redutíveis a qualquer outra ordem de fatos, seja ela psicológica ou física. Os fatos sociais na acepção de Durkheim podem ser captados de forma cristalizada nos modos de pensar, agir e sentir que são regularmente adotados pelos indivíduos em sociedade. A regularidade não é apenas interpretada como sintoma de objetividade mas, principalmente, como resultante de uma pressão exterior (coerção) que as formas coletivas de pensar, agir e sentir exercem sobre os indivíduos. Durkheim toma do seguinte modo a caracterização dos fatos sociais:

Citação de Durkheim: “Quando desempenho minha obrigação de irmão, esposo, ou cidadão, quando satisfaço os compromissos que contrai, cumpro meus deveres que estão definidos para além de mim e dos meus atos, no direito e nos costumes (...). Estamos pois em presença de modos de agir, de pensar e de sentir que apresentam a notável propriedade de existir fora das consciências individuais. Não somente estes tipos de conduta de pensamento são dotados dum poder imperativo e coercivo em virtude do qual se lhe impõem quer ele queira quer não”.

Assim, o fato social possui caráter de exterioridade em relação às consciências individuais e exerce uma ação coercitiva sobre os sujeitos. Durkheim afirma que isso pode ser verificado nas formas coletivas de comportamentos. Para o autor, estas antecedem e prosseguem aos indivíduos, provando portanto, sua existência e autonomia em relação a estes. A coercitividade está presente no processo de socialização, ela ocorre porque o fato social é geral e sobretudo, coletivo. É um estado do grupo que se repete nos indivíduos porque se impõe a eles:

“Basta observar como são educadas as crianças. Quando reparamos nos fatos tais como são, e como sempre foram, salta aos olhos que toda educação consiste num esforço para impor à criança maneiras de ver, de sentir e de agir às quais ela não teria chegado espontaneamente. Desde os primeiros tempos da sua vida a coagimos a comer, a dormir e a beber a horas regulares. Coagimo-la à limpeza, à calma, à obediência; mais tarde, coagimo-la a ter em conta os outros, a respeitar os usos, as conveniências, a trabalhar, etc.”( Durkheim, 1978, p. 89).

Durkheim ainda coloca que, se com passar do tempo a coação deixa de ser sentida pelo indivíduo, é devido ao nascimento de hábitos e tendências internas que a tornam inútil. Os hábitos e os costumes são realizados mecanicamente e então, passam a fazer parte da vida social sem provocar maiores questionamentos nos indivíduos. Nesse sentido, o autor preocupa-se em afirmar a existência real de uma espécie de consciência distinta das consciências individuais e cujas manifestações podem ser captadas nas formas cristalizadas e relativamente permanentes como: regras morais, preceitos jurídicos e religiosos e nas correntes sociais ou, ainda nos movimentos menos consolidados e na base material da vida social tais como tecnologia, formas de habitação, vias de comunicação social, entre outros. A partir dessa verificação, Durkheim entende a consciência coletiva como um conjunto de crenças e sentimentos comuns à média dos indivíduos; tendo vida própria e difusa em toda sociedade. Esta forma de consciência também pode ser verificada nos grandes rituais coletivos. Ele fala que numa grande assembleia, as manifestações de entusiasmo, de indignação ou de piedade que se desencadeiam não têm origem em nenhuma consciência particular.

Chega a cada um dos indivíduos do exterior e os arrasta mesmo contra suas vontades. Se houver resistência por parte do indivíduo, ele sentirá a pressão exercida pela consciência coletiva, se não, a pressão existirá, mas ele será envolvido de tal forma que não a sentirá.

É desta entidade consubstanciada e isolada através de fases ou frequência média de ocorrência de certos modos de comportamento dentro do grupo que o autor extrai todos os elementos explicativos das realidades encontradas já que ela atuaria como força de pressão sobre as consciências individuais.

Assim Durkheim exclui qualquer possibilidade de que as crenças, práticas e tendências de grupo tomadas coletivamente sejam determinadas por fatores psíquicos, orgânicos ou físicos. Ele configura o objeto de investigação específico da Sociologia.

 

A CONSTITUIÇÃO DO MÉTODO

 

Posterior à fase de determinação do fato social, Durkheim anuncia, então, as regras metodológicas de tratamento deste objeto de modo a obter sobre o mesmo um conhecimento que se aproxime de todos os pressupostos positivistas que circundavam a ciência daquela época.

A regra que considera fundamental na observação dos fatos sociais é tratá-los como coisas, pois este fenômenos são objetos e devem ser tratados como tais. Segundo ele, para demonstrar esta proposição não é necessário nenhum questionamento de natureza, basta constatar que são os únicos dados oferecidos ao sociólogo: “

É objeto, com efeito, tudo o que é dado, tudo o que se oferece, ou antes, se impõe à observação. Tratar dos fenômenos como coisas é tratá-los na qualidade de data [grifo do autor] que constituem o ponto de partida da ciência” (Durkheim, 1978, p. 100).

Isto significa considerá-los como exteriores aos sujeitos, dados que só podem ser penetrados pela observação de suas manifestações, pela descrição do que ocorre. Daí prescrever a suspensão de todas as noções prévias:

“A nossa regra reclama do sociólogo que este adote o estado de espírito em que se colocam os físicos, químicos ou fisiologistas, quando se embrenham numa região ainda inexplorada do seu domínio científico. O sociólogo, ao penetrar no mundo social, precisa ter consciência de que penetra no desconhecido; é preciso que ele se sinta em presença de fatos cujas leis lhe são tão insuspeitas como eram as da vida antes da biologia se ter constituído; é preciso que esteja preparado para fazer descobertas que o surpreenderão e o desconcertarão” (Durkheim, 1978, p. 77).

Durkheim separa a ideia de objeto (coisa), mas admite que se a ideia é imposta pela observação do objeto ele se identifica com o mesmo. Portanto, os conceitos científicos devem sempre ser construídos a posteriori ao processo de investigação para garantir assim sua adequação à natureza das coisas. O que Durkheim exige do sociólogo é uma atitude de neutralidade face ao fato social (objeto de investigação) pois que apenas dele poderá vir a explicação de sua natureza.

Desse modo, tratar os fatos sociais como exteriores aos indivíduos e como coisa é ter para com eles uma atitude de afastamento porque coisa é todo objeto de conhecimento que não é compenetrável, tudo aquilo de que não podemos ter uma noção adequada por um simples procedimento de análise mental, tudo o que o espírito só consegue compreender na condição de se extroverter por meio de observações e de experimentações, passando progressivamente dos caracteres mais externos e mais imediatamente acessíveis aos menos visíveis e aos mais profundos.

Por isso Durkheim propõe a construção do objeto positivo de pesquisa através da fixação de um conceito inicial do que irá ser observado. Este conceito inicial tem por base o agrupamento ou classificação dos fatos por seus sinais exteriores mais evidentes. Porém, a classificação, será nesse caso, inteiramente determinada pelo objeto e, portanto, distinto da classificação em que o sujeito pesquisador tem por referência, suas ideias.

A classificação preliminar dos fenômenos por suas características mais externas é necessária à realização das observações que permitem atingir as causas mais profundas e que explicam sua existência.

Os caracteres superficiais considerados não acidentais devem ser para o sociólogo elos que possibilitam desvendar os atributos fundamentais dos fatos sociais.

 

A DISTINÇÃO ENTRE O NORMAL E O PATOLÓGICO

 

Como Durkheim acreditava que função da Sociologia seria a de apontar soluções para a anomia presente na sociedade europeia, ele faz um capítulo, no qual procura estabelecer as regras que permitem distinguir o normal do patológico. Aqui ele quer conciliar o ideal de ciência pura com o ideal pragmático, ou seja, a aplicação do conhecimento sociológico na planificação da conduta dos homens tendo por objetivo atingir fins, por ele considerados como desejáveis:

“A ciência é assim quase destituída de toda a eficácia prática e, por conseguinte, perde a sua razão de ser; com efeito, qual o sentido de tentarmos conhecer o real se esse conhecimento não tem qualquer utilidade na vida? Poder-se-á argumentar que, ao revelar-nos as causas dos fenômenos, a ciência nos fornece os meios para os produzirmos à nossa vontade e, consequentemente, para realizar os fins que por razões supra científicas a vontade humana pretende atingir” (Durkheim,1978, p. 110).

A partir dessa discussão, ele procura então, descobrir e distinguir as diferenças entre normalidade e patologia no âmbito da vida social. Assim, procura delimitar fronteiras entre o normal e o patológico e como decorrente disso, as formas de conduta desejáveis e não desejáveis. Mas para conseguir isso sem incorrer nos erros valorativos e, portanto, subjetivos, propõe critérios que derivando da própria natureza do objeto preencheriam assim o requisito de objetividade postulado pela versão positivista da ciência.

Neste intuito é que toma como critério de normalidade o grau  de generalidade de ocorrência de um fenômeno em uma espécie social dada. O tipo normal ou tipo médio poderia ser assim objetivamente construído pela computação dos caracteres mais frequentes da espécie em sua forma habitual:

“1º - Um fato social é normal para um tipo social determinado, considerado numa fase determinada de desenvolvimento, quando se produz na média das sociedades desta espécie, consideradas numa fase correspondente de desenvolvimento.

2º - Os resultados do método precedente podem verificar-se mostrando que a generalidade do fenômeno está ligada às condições gerais da vida coletiva do tipo social considerado.

3º - Esta verificação é necessária quando este fato diz respeito a uma espécie social que ainda não cumpriu uma evolução integral” (Durkheim, 1978, p. 118).

O critério de normalidade social é portanto relativo, pois refere-se à regularidade de fenômenos não em abstrato mas considerando as espécies sociais ou tipos de sociedade nos diferentes estágios de evolução em que se encontram.

Durkheim ainda vai demonstrar que a generalidade que permite identificar o normal, corresponde à própria natureza do fenômeno.

Isto é, não é ocasional mas se prende às condições gerais da vida coletiva do tipo social considerado. Para Durkheim seria inexplicável que certos caracteres se possam generalizar em uma espécie, caso não fossem pelo menos em seu conjunto os mais vantajosos e produzissem nos indivíduos meios de resistir melhor às causas da destruição. Aqui fica claro, o pressuposto evolucionista da seleção natural, da permanência das formas superiores e eliminação das inferiores como justificativa para a defesa do caráter de normalidade que deseja estabelecer.

Para os casos da transição social, em que um aspecto social não cumpriu sua evolução integral (3º caso), a verificação seria indispensável pois poderia ocorrer que um fato fosse geral por ser herança de um tipo social passado sem que correspondesse às exigências da situação atual. Neste caso, mesmo sendo geral, o fato apenas teria aparência de normalidade.

Assim, explicando a generalidade por causa supostamente natural, Durkheim supõe ter enquadrado o desejável em termos do que é observável e portanto mantendo-se objetivo ao propor esquemas de ação que permitam aos homens de Estado manter a normalidade social, restabelecendo-a quando está perturbada pelo reencontro de suas condições de equilíbrio.

 

A CONSTITUIÇÃO DAS ESPÉCIES SOCIAIS

 

Segundo Durkheim, para o historiador, as sociedades constituem individualidades heterogêneas que se podem comparar. Cada povo tem uma fisionomia específica, um direito, uma moral, uma organização econômica, tornando impossível qualquer generalização. Por outro, ele identifica que a filosofia considera a generalidade da espécie humana e seu caráter racional como explicação para as diferentes sociedades e que isso é apenas provisório, pois o que conta, é na verdade, o ser humano.

Para ele, o conceito de espécie social é bastante próximo ao da Biologia pois resulta do agrupamento das unidades observadas, no caso das sociedades, a partir das características estruturadas comuns que apresentam. Considerando a espécie social como o resumo das unidades constatadas as semelhanças, reconhece a impossibilidade de um levantamento de todos os casos individuais para a constituição das espécies.

Diante da impossibilidade de fazer esse levantamento morfológico individual, Durkheim toma a horda como o átomo social mais simples de análise. A horda refere-se à sociedade que:

“Não abrange e que nunca abrangeu nenhum outro agregado mais elementar e que se decompõe imediatamente em indivíduos. Estes não formam no interior do grupo total grupos especiais e diferentes do precedente; estão justapostos atomicamente” (Durkheim, 1978, p. 128).

Embora admitindo a inexistência histórica das sociedades tipo horda, o autor vê nas sociedades clânicas uma repetição de hordas justapostas, que por sua vez dariam origem às sociedade mais complexas até às mais evoluídas como as urbanas e industriais:

“Quando a horda deixa assim de constituir uma sociedade inteira para se tornar num segmento social, muda de nome, passa a chamar-se clã (...). Clã é um agregado social que não se decompõe em nenhum outro mais restrito ” (Durkheim, 1978, p. 128).

A partir dessa classificação preliminar, Durkheim monta seu esquema de evolução das espécies sociais:

a) sociedades tribais: sociedade polissegmentária simples – quando os clãs estão associados entre si de modo a formar grupos intermediários entre cada um deles e o grupo global que abrange a todos; é a reunião de clãs em forma de aldeias.

b) sociedade polissegmentária simplesmente composta – reunião das sociedades precedentes.

3) sociedade polissegmentária duplamente composta – resultam da imposição ou fusão de várias sociedades simplesmente compostas.

4) sociedade complexa – resultam da combinação de diferentes espécies sociais; diferentes geradoras que ao combinarem dão origem a uma sociedade totalmente nova.

Assim mesmo, não querendo chegar a uma classificação completa de escala tipológica social, Durkheim enuncia o princípio de que a espécie mais complexa resulta do processo de evolução do tipo que a antecede.

Depois de constituídos os tipos, pode-se distinguir variedades em cada um deles, verificando até que ponto a composição primitiva não afeta mais a organização administrativa e política da sociedade.

 

A EXPLICAÇÃO DO FATO SOCIAL

 

Neste capítulo, Durkheim procura responder a origem do fato social. Para ele, as funções do fato social não explicam sua origem. August Comte havia dito que sua origem está na força progressiva da humanidade que incita diretamente o homem a melhorar continuamente sob todos os aspectos a situação em que se encontra. Mas isso só caracteriza o fato, mas não explica seu nascimento e nem sua aparência. Portanto, para Durkheim, quando se busca a explicação de um fenômeno social, tem-se de investigar separadamente a causa eficiente que o produz e a função que desempenha: Para despertar o espírito de família onde este se revela mais fraco, não basta que todos compreendam as vantagens de tal necessidade; é necessário fazer atuar as suas causas, pois só elas o podem produzir ” (Durkheim, 1978, p. 133).

Assim, quanto à origem do fato social, Durkheim o explica mediante o arcabouço teórico-metodológico das ciências da natureza. Busca na Biologia as razões e os fundamentos de sua tese. Segundo ele, a vida ou fato social não poderiam vir do mero desenvolvimento natural da humanidade e nem do indivíduo em si, pois uma vez formado, o fato social reagiria contra este indivíduo. Logo, o fato social tem uma natureza própria e impõe maneiras de pensar, agir e sentir as consciências individuais. A sociedade é comparada por Durkheim à água. A água é formada por dois gases que, ao combinarem, dão origem a um elemento com uma qualidade diferente dos posteriores, portanto a sociedade, não pode ser vista como uma tendência natural do homem, nem como somatória das consciências individuais, mas como combinação de pessoas e de coisas, que ao se combinarem, produzem um ser diferente e superior, com uma nova qualidade: a sociedade.

 

AS REGRAS PARA ADMINISTRAÇÃO DA PROVA

 

Neste capítulo, Durkheim estabelece o método para demonstrar empiricamente a relação de causalidade entre os fatos sociais.

Em termos empíricos a relação de causalidade entre dois fenômenos reduz-se à constatação de que a presença de uma causa condiciona a ocorrência do efeito, do que decorre a exigência de observações comparativas entre a forma como os fenômenos reagem entre si.

Evidentemente, Durkheim sabe que o método experimental é totalmente inviável para a Sociologia, restando-lhe apenas a possibilidade de aplicação do método comparativo ou mais especificamente das variações concomitantes: “Vimos que a explicação sociológica consiste exclusivamente no estabelecimento de relações de causalidade, quer se trate de confrontar um fenômeno com sua causa, ou uma causa com os seus efeitos úteis. Como os fenômenos sociais escapam evidentemente à ação do operador, o método comparativo é o único que convém à Sociologia” (DURKHEIM, 1978, p. 150).

Isto significa que a lei de causalidade seria demonstrada na constatação de que dois fenômenos variam regularmente em uma determinada direção. Ele a firma que isso pode ser verificado quando há paralelismos dos valores de dois fenômenos, desde que efetuados num número repetido de casos variados. É a prova de finitiva de que existe uma relação entre eles; que os fenômenos têm naturezas semelhantes; que um fenômeno não é causa do outro e que ambos são efeitos de uma mesma causa ou que pode existir entre eles, um terceiro fenômeno.

Durkheim usa como exemplo seu estudo sobre o suicídio. Segundo ele, pode-se afirmar que a tendência para o suicídio varia conforme a tendência para a instrução. Nesse caso, a instrução levaria o indivíduo ao suicídio, tese a qual ele refuta, dizendo que a instrução por maior que seja não pode contrariar um princípio fundamental que é o de conservação da espécie, portanto, tanto o suicídio como a instrução seriam dois fenômenos causados e a causa seria o enfraquecimento do tradicionalismo religioso, aparecendo aí o terceiro fenômeno. É como dizer “menos religião, maior necessidade do saber, maior tendência para o suicídio” (DURKHEIM, 1978, p. 153).

Nesse sentido, as manifestações empíricas expressam a natureza da coisa, se há correlação na forma como dois fenômenos se desenvolvem empiricamente, isto significa que suas naturezas estão também conectadas, ou seja, um depende do outro.

Este método aplicado à Sociologia supre a ausência de outros métodos dada a imensa variedade dos fatos sociais possíveis de comparação, além de oferecer a vantagem de prescindir de um número ilimitado de casos para que se chegue às leis ou generalizações: “O método das variações concomitantes não nos obriga a enumerações incompletas nem a observações superficiais. Para que dê resultados bastam alguns fatos. A partir do momento que se provou que, num determinado número de casos, dois fenômenos variam da mesma forma, podemos ter certeza de estarmos perante uma lei” (DURKHEIM, 1978, p. 154).

Entretanto, Durkheim salienta que o método só produz resultados, se aplicado com rigor, isto é, de forma a demonstrar as variações de dois fenômenos em uma sequência regular e contínua de seu desenvolvimento tomando-se, para tanto, um número razoável de dados. O modo de construir as séries estatísticas varia segundo os fenômenos que se pretende analisar, podendo os dados serem extraídos de uma única sociedade, de muitas sociedades da mesa espécie ou de espécies sociais distintas. Na análise de As regras do método sociológico fica evidenciada a orientação positivista e cientificista presente em Durkheim, quando na ênfase de produzir um conhecimento sociológico científico tendo por critério de cientificidade a objetividade que pretende ser atingida. O seu método é, em todas as etapas, marcado pelo esforço de mostrar tal possibilidade: quando empresta o caráter de coisa aos fatos sociais; na ênfase à classificação e ordenação dos dados para extrair daí a revelação da sua natureza; na crença de se construir indutivamente o corpo teórico; na ânsia pelo conhecimento absoluto expresso em leis de causalidade que seriam verdadeiras já que não são construções arbitrárias de uma lógica subjetiva de relações naturais registradas pelo pesquisador.

 

REFERÊNCIAS

ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. São Paulo: Martins Fontes. Brasília: UnB, 1987.

DURKHEIM, Émile. O Suicídio: Um Estudo de Sociologia.

DURKHEIM, Émile. As Formas Elementares da Vida Religiosa. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Coleção Os pensadores).

DURKHEIM, Émile. A Educação e a Sociologia. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1996.

DURKHEIM, Émile. A Educação Moral. Rio de. Janeiro: Vozes, 2008.

DURKHEIM, Émile. Sociologia e Filosofia. Rio de Janeiro: Forense, 1970

DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Coleção Os pensadores).

DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Coleção Os Pensadores).

MARTINS, Carlos B. O que é sociologia. São Paulo: Brasiliense, 1986.

SMELSER, Neil; WARNER, Stephen. Teoria sociológica. Madrid: Espasa-Calpe, 1982.

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